sexta-feira, 6 de março de 2015

QUANTO EU SEI

ÀS VELAS O PENSAMENTO
QUANTO MAIS EU PENSO
TANTO MAIS EU ANDO
QUANTO EU MAIS ANDO
É TANTO O QUANTO EU SEI

João Mendes Luís, Março 2015

sexta-feira, 25 de julho de 2014

Afinidades

Não preciso ler o que viveste;
é no teu rosto que o tempo escreve
a página inteira
que me aproxima de ti.

in Horas de Água de Maria João de Carvalho Martins

sexta-feira, 18 de julho de 2014

Diz-me

Diz-me

Diz-me que o presente
é este fio de luz que prende o meu cabelo
este sol que aquece a raiz da minha nuca
e me enlaça p'la cintura
como um resgate do tempo
à viagem das águas.

Diz-me que nada mais há
senão este agora
em que os pássaros festejam
as penas que vestem
e eu me rendo
à rara felicidade de me saber viva.

Diz-me que esta
apenas esta
é a verdade que procuro
e jamais temerei o final
neste princípio.

in Horas de Água de Maria João de Carvalho Martins

sexta-feira, 11 de julho de 2014

O Mar

O mar diz mais de si na tormenta
que no silêncio dos dias mansos
onde o suave marulhar
encanta os corações incautos.

Quando o vento rasga a crista de todas as ondas
e derruba qualquer altivez
aí si, ele se revela
galgando a natureza,
inteiro e presente,
assolando qualquer dúvida.

in Horas de Água de Maria João de Carvalho Martins

sexta-feira, 25 de maio de 2012

Nascida a 22 de Maio

Estava eu muito bem a brincar nos baloiços com a minha mãe e com a avó quando a mamã disse que tínhamos que ir, sentiu que havia de ir para o hospital
Tomei o meu banhinho e a mamã também e fui com ela no carro do avô até ao mesmo hospital onde eu nasci... fez agora 3 anos
A avó ficou a tomar conta dela lá no Szent Margit Korház e eu voltei para casa com o avô pois já era de noite e eu deito-me sempre cedo
Apesar de o nascimento da mana ter sido muito mais rápido do que o meu, ainda houve tempo para comunicar os acontecimentos a algumas partes.
Em poucas horas a Hajni estava cá fora e fizeram-lhe as mesmas maldades, exactamente as mesmas que me fizeram a mim, voltas e mais voltas, tubos enfiados pela boca, palmadas e beliscões
 Ainda um bocadinho apreensiva por estar cá fora, chorou
Por fim foi cortada a ligação com a mamã, mas pôde de imediato voltar para perto do sítio onde estava
Igualzinho ao que fizeram comigo, levou com a praxe da água na cabeça e depois a balança
Mais não sei quantos puxões e outros tantos empurrões, a que chamam medições
larguras e alturas, que ainda somente se chamam comprimentos
depois a sua primeira roupinha e a jeitosa da fralda
Insisto que a luz naquela sala é muito forte, pois a minha mana também se queixou do mesmo
Mas logo de seguida teve direito à sua primeira refeição, ou pelo menos ficou a conhecer o sítio onde é para comer
Ou seja beber, pois no princípio a Hajni só vai ter direito a leitinho
Cansadinha com tudo o que lhe fizeram e de tantas coisas novas para aprender, acabou logo de seguida por adormecer

Texto gentilmente cedido por Árpád Zsolt, um menino de 3 anos de idade

domingo, 26 de setembro de 2010

A falácia do espantalho

O caminho da perfeição é um canal estreito e tem escolhos, obriga à rejeição do fácil e do expectável, portanto uma luta constante contra o pecado e o vício.
O caminho da perfeição é solitário, sempre daremos conta de que a maioria das pessoas são infinitamente idiotas e por tal não oferecem benefício.
Percorrer o caminho da perfeição dificilmente assegura um reconhecimento de mérito ou outro qualquer, tendo em conta ser verdade que raramente o sucesso depende da sabedoria ou da inteligência.
Porém, para garantir o sucesso neste mundo não basta ser estúpido, há que percorrer alguns caminhos e promover aquilo que por si só tem pouco ou nenhum valor. A chave do sucesso está na promoção, não importa de quê e pouco importa como.
“Abominável coisa é o bom êxito, seja dito de passagem. A sua falsa parecença com o merecimento ilude os homens. Para o vulgo, o bom sucesso equivale à supremacia. A vítima dos logros do triunfo, desse menecma da habilidade, é a história. Só Tácito e Juvenal se lhe opõem. Existe na época e sente uma filosofia quase oficial, que envergou a libré do bom êxito e lhe faz o serviço da antecâmara. Fazei por serdes bem sucedido, é a teoria. Prosperidade supõe capacidade. Ganhai na lotaria, sereis um homem hábil. Quem triunfa é venerado. Nascei bem-fadado, não queirais mais nada. Tende fortuna, que o resto por si virá; sede feliz, julgar-vos-ão grande. Se pusermos de parte as cinco ou seis excepções imensas que fazem o esplendor de um século, a admiração contemporânea é apenas miopia. Duradora é ouro. Pouco importa que não sejais ninguém, contanto que consigais alguma coisa. O vulgo é um narciso velho, que se idolatra a si próprio e aplaude o vulgar. A faculdade sublime de ser Moisés, Esquilo, Dante, Miguel Ângelo ou Napoleão, decreta-a a multidão indistintamente e por unanimidade a quem atinge o alvo que se propôs, seja no que for. Que um tabelião se transforme em deputado; que um falso Corneille componha Tiridates; que um eununco chegue a possuir um harém; que um Prudhomme militar ganhe por casualidade a batalha decisiva de uma época; que um boticário invente solas de papelão para o exército de Samba e Mosa, e, vendendo-as por couro, consiga arranjar uma fortuna de quatrocentos mil francos de rendimento; que qualquer pobretão case com a usura e a faça parir sete ou oito milhões, de que ele é pai e ela mãe; que qualquer pregador arranje a ser bispo, à força de falar pelo nariz; que o mordomo de qualquer casa grande saia dela tão rico, que obtenha a pasta das Finanças, os homens chamam a isso Génio, do mesmo modo que chamam Beleza à cara de Mousqueton e Majestade à aparência de Cláudio. Confundem com as constelações do abismo as estrelas que os gansos imprimem com as patas na superfície mole do lodaçal.”
A falácia do sucesso, Victor Hugo in Les Misérables, 1862.
Segundo o escritor francês “tudo o que está morto como facto, continua vivo como ensino”, todavia a realidade dramática do presente é a ignorância do passado, do saber a história. Por ser assim, sempre que o futuro se torna presente, emerge o bestial espanto dos brutos, uma espécie de voraz neofobia em que tudo parece incerto.
A principal socorrência dos estúpidos com írrito sucesso é a fé em milagres (onde a hipotética solução é transcendental tal qual uma sentença sem considerandos) ou o simples seguidismo a filosofias alheias.
Se por um lado nunca alguém se tornou mais sábio por conservar no pensamento todas as filosofias humanas (do mesmo modo que ninguém se tornou mais saudável por tomar todos os remédios de uma farmácia), por outro lado e tal como referido, o sucesso raramente depende da sabedoria ou da inteligência.

quinta-feira, 8 de abril de 2010

Road trip - day 1

14h30, 30 de Maio: Após um vôo Lisboa – Budapeste, de mochila às costas procurou no estacionamento por um BMW 325 Ci Cabrio que o aguardava para uma aventura de estrada por 8 paises, 8 cidades, algumas praias, imensos monumentos e 3.630,5 Kms de um bronze à pedreiro... na companhia de James Stuart.

Nesse reencontro de amigos a maior dificuldade observada foi a colocação da dita mochila com 60×40x30 no porta-bagagens, previamente atascado com os mais diversos artigos.

Primeiro destino: Fonyód, no lago Balaton - o maior lago na Europa, com 592 Km2, um comprimento de 77 km, largura que varia entre os 4 e os 14 km e uma profundidade máxima de 11 metros, embora a média seja de 3,2 metros) - não sem antes dar uma voltinha pela magnífica cidade de Budapeste.

Numa tentativa de revisitar a Praça dos Heróis depararam com algum tipo de festa a decorrer na Avenida Andrássy e que impedia o acesso à protecção do Arcanjo Gabriel, Gábor portanto.

Inevitável foi o salto a Buda, na margem do Danúbio fotografa-se melhor o Parlamento.

Umas voltas por Buda e Aquincum anteciparam um regresso a Pest pela ponte das correntes e logo o caminho da auto-estrada M7.

Fonyód está na margem sul do Lago Balaton e à beira desse os blocos de apartamentos onde a dormida estava planeada para duas ou três noites. No dia seguinte havia a experimentar o Trabant do James...

Road trip -day 1 é adaptado de Euro Road Trip Budapeste - Lisboa (I) da autoria de Nyto, em Argumentos.

Road trip - day 2

31 de Maio, um Domingo com temperatura amena, agradável para quem pretendeu passear junto às margens do grande lago, almoçar na marina de Fonyód para a memória de uns bons bifes de cebolada e à cigana rematado com sopa de alho tudo acompanhado de umas canecas de Szalon, a cerveja castanha fabricada em Pécs.
A água do Balaton enregelou imediatamente os ossos de quem lá foi só para teste até aos joelhos. Ao largo e de galochas, só resistiam os pescadores.
A profundidade do lago é bastante baixa, com uma média a rondar os três metros e de fundo de areia negra sempre muito plano, é estável e seguro. Contudo em quase toda a extensão da margem sul é possível caminhar distâncias de uns quinhentos metros de afastamento sem que a àgua suba a mais do que a cintura.
O observatório de advertência do Serviço Meteorológico Nacional, em Siófok, cuida dos avisos de tempestade através de um sistema de farolagem muito peculiar com umas 30 ou 60 piscadelas por minuto que significam respectivamente o nivel I ou II de tempestade, esta última quando os ventos são na ordem de 17 m/s (34 nós) ou superiores.
Em momento de tempestade, mesmo com água pela cintura a possibilidade de afogamento é bastante elevada para os banhistas: caso não sejam suficientemente atentos e rápidos a abandonar o lago, os ventos levantam uma neblina densa que impede a respiração normal e resulta em afogamento.
Depois cumpriu-se a promessa de James Stuart, uma voltinha de Trabant, fumaceira e ruído também para memória.

Road trip - day 3

No primeiro dia de Junho, a meio da manhã rumavam na M7 em direcção à Croácia. O controlo de fronteira foi apenas documental, coisa rápida. Num instante atingiam, sempre por auto-estrada a capital, Zagreb.
Zagreb é assim pequena, no sopé de uma montanha. Há menos de um século Zagreb não era uma capital… porque a Croácia não era um país (até 1919 o território da Croácia era uma das províncias eslavas do Reino da Hungria, tal como a Eslováquia).
Às voltas e mais voltas não saíam do mesmo sítio que era só aquilo.
Para além da grande catedral (Zagrebačka Katedrala) e do larguinho simpático ali à sua frente, descendo a rua Bakačeva, pouco depois encontraram o centro da administração política nacional, um conjunto de edifícios normais, apenas um pouco mais imponentes do que os restantes da cidade, à volta de uma espécie de alameda muito bem cuidada e florida (ao topo Zrinjevac, um conjunto de 3 quarteirões de jardins e ao fundo a estação ferroviária central).
Pela falta de deslumbramento simplesmente encolheram os ombros e decidiram a rumagem directa para a Eslovénia, a tempo de um passeio a pé por Ljubjana, como mínimo.
Almoçaram num parque, de estacionamento, sim, sem qualquer registo especial de vistas, e foi sandes… de uma coisa que parecia ser fiambre e que voltou a ser almoço em Itália, no dia seguinte, com feijão preto.
Os tapetes começavam a ficar cheios de migalhas de Legényfogó, aqueles biscoitos maravilhosos em espiral, com sabor a chocolate e que estiveram presentes até quase ao final da viagem.
O controlo de fronteira entre Croácia (Republika Hrvatska) e a Eslovénia foi decididamente o pior momento da viagem Budapeste-Lisboa. É verdade que uma caixa de Lego enfiada no compartimento da bateria, ao lado do motor, não emprestou um sentimento de grande confiança aos guardas de fronteira… que rebuscavam entre números de série e recantos do automóvel, um não-sei-quê que acabou em nada, só desarrumo e mau humor.
Ainda era dia suficiente para o passeio a pé em Ljubljana, foram tiradas umas boas fotografias e trocadas imensas piadolas a cada sinal de trânsito e parqueamento encontrado (“zona” escreve-se com “c” e não com “z”).
Ljubljana parece ser uma vila e nem tanto uma cidade, bastante bonita por sinal.
Ljubljana é a capital de um Estado muito pequeno e que outrora foi uma província eslava da Áustria.
Anoitece ainda na Eslovénia mas a dormida aconteceu num excelente hotel de San Dona di Piave, uma pequena cidade na província de Veneza, sem dramas, mais ou menos fácil de encontrar… assim ao acaso e sorte.

Road trip - day 4

O pequeno almoço do hotel em San Dona di Piave foi farto e à mesa debateu-se acaloradamente o significado desse mesmo nome.
Na volta à estrada, o dia 2 de Junho estreava-se agradável com uma espécie de romaria, uma celebração local em dia feriado.
A primeira paragem prevista para a jornada era Veneza e assim foi. Não havia desconhecimento pelo acesso e bem que era impossível estacionar senão nos silos à entrada da cidade.
Os dois camaradas separaram-se por umas horas e novamente com a promessa de captarem umas boas fotos “para a troca”. Não menos importante eram as novidades, in loco, observar como resultara a nova passagem esgalhada pelo Calatrava.
A tradição continuava a ser o que era e ali estavam eles, os vaporettos a transportar turistas às centenas e milhares pelo grande canal adentro, invariavelmente com escala na famosa Piazza San Marco, que aliás é a única praça de Veneza.
Ao final da tarde já se encontravam em Milão, avenida acima, avenida abaixo a concluir que havia mais espaços verdes nos topos dos prédios do que propriamente junto ao chão.
O grande fascínio da catedral é não somente o tamanho mas o facto de ser toda forrada a mármore branco.
“- Toda em mármore?… é pá nem reparei”
“- Então foste à praça fazer o quê?”
“- Pois é… mas tú também foste lá fotografar o Scala e nem deste conta que o gajo da estátua em frente era o Da Vinci”
“Ah… puseram o gajo de costas”
Prometeram ir dormir a França, embora estivesse, por outro lado fora de questão transpor a fronteira sem antes "manjarem" uma pizza ou uma lasagna al forno, onde quer que fosse, mas havia de ser em Itália sem dúvidas.
Algures, no meio de um monte escuro como breu (que um nome certamente terá, mas que não se memorizou porque naquele momento pareceu ser em nenhures) de San Lorenzo al Mare ou lá perto, encontraram um restaurante à pinha de clientes. Entre anti pasti e pasti foram experimentados uns calamares fritos que reduziram espaço no estômago para acabar com as enormes pizzas.
Eram umas duas da manhã quando chegaram ao Mónaco.
Durante cerca de uma hora, talvez ainda sob parcial efeito das birras, a diversão estava em subir e descer as ruas de Monte Carlo em excesso de velocidade, a fazer de conta estarem no Grand Prix de Formula Um a pontos de aborrecer a polícia local que já extravasava de tolerância.
A pernoita acabou por ser em Cannes.

Road trip - day 5

O hotel era manhoso, daqueles que só reconhece o cliente à entrada pela exibição do cartão de crédito, tudo impessoal. A meio da noite foi aquilo que surgiu, assim do nada, à beira de uma estrada. Os primeiros e únicos funcionários que se encontraram foi quando do pequeno almoço, uma senhora que tratava da reposição dos alimentos e um outro indivíduo, com postura de chefe, junto a um balcão que parecia ser uma recepção diurna (não havia chaves a entregar, nem pagamentos a acertar porque tudo era automático). Serviu perguntar ao altivo onde era Cannes… e este indignado respondeu que estavam na Côte d’Azur, estavam ali mesmo em Cannes.
A verdade é que nem passados cinco minutos da abalada, já procuravam por estacionamento bem no centro da ville. Novamente os caprichos, ninguém sairia de Cannes sem um bom mergulho na praia.
Mas e depois de Cannes, sempre junto à costa, apareceram outras praias iguais e melhores.
Parando aqui, parando acoli, mais um mergulho e outro… contavam-se mais mergulhos do que quilómetros até surgirem outros caprichos… agora é que ninguém abandonaria o sul da França sem uma passagem por Saint Tropez e assim foi porque tinha que ser, mas desilusão também se lhe comente.
As horas a passar e o sol tórrido só dava apetite a mais mergulhos até que se perdeu a conta de quantas vezes se estacionou, às vezes bem, outras vezes de qualquer maneira em frente às tantas praias e lugares próximos ao paraíso se é que isso existe diferente daquilo.
Certa recordação, nome simpático para novo capricho, obrigava-os a procurar por um coliseu romano que se via desde uma auto-estrada, a que tomaram na direcção de Marselha. Pararam em Nimes, ali estiveram um bom bocado e já anoitecia à volta do coliseu e de todo o centro histórico.
Exaustos de tanta praia e tanto sol e já com a pele a arder de tão queimada, foi no limite que chegaram a Barcelona, novamente no trânsito da noite e já no dia seguinte. Surgiu um hotel de estudantes como alternativa para a dormida, daqueles em que se paga por pessoa e compartilha o quarto com estranhos. Mas a solução foi simples… pagaram o equivalente a seis pessoas e compartilharam o quarto com ninguém.

sexta-feira, 26 de março de 2010

Károly Kadet (1923-2010)

Nasceu a 14 de Janeiro de 1923 no Reino da Hungria, um país recentemente independente porém isolado devido à desanexação forçada da Áustria como consequência da derrota na primeira Guerra Mundial.
A Grande Hungria foi tornada pequena e o povo não se conformava, como nunca se conformou até hoje. Károly nasceu exactamente nessa época conturbada, numa sociedade insatisfeita e deprimida, onde a ansiedade pela revolta era uma constante.
O Anjo Gabriel, o principal dos anjos e aquele que protege os húngaros, sentiu maior e excepcional compaixão por este ser em idade jovem, pois foi incapaz amparar tantos outros, todos os obrigados a defender a pátria, uma maioria a tombar por ela.
O desenrolar da segunda Grande Guerra fez da Hungria aliada da Alemanha e a mocidade foi levada para as frentes de batalha, às invasões da Jugoslávia e também da Rússia.
Após sucessivas derrotas, já perto do final da guerra centenas de combatentes húngaros acabaram incorporados no que restava das forças alemãs, a Wermacht, por colapso do seu próprio exército, o Magyar Honvédség.
Károly e outros camaradas acabaram capturados pelos americanos em solo austríaco. Valeu-lhe essa sorte, pois foi em França que permaneceu uma longa temporada como prisioneiro e não na Sibéria, escapou portanto ao pior. Durante a sua ausência, isto é nesse entretanto, a Hungria foi transformada em república e logo numa república popular.
Károly Kadet estudou economia e nessa qualidade dedicou toda a sua vida de trabalho ao serviço do banco nacional, o Magyar Nemzeti Bank. Num sistema socialista era precisamente o banco nacional que fomentava em exclusivo o desenvolvimento industrial e agrícola, ou seja uma só instituição retinha poupanças e proporcionalmente emprestava em circuito fechado e controlado pelo Estado.
A propósito dessa actividade e função do banco central, Károly Kadet escreveu o livro “Financiamento de investimentos industriais” (Iparvállalati beruházások finanszírozása és működtetése), muito antes da liberalização dos sistemas bancários e ainda fora dessa lógica.
Já estava reformado do banco quando assistiu ao fim da república popular e à instituição da República da Hungria (Magyar Köztársaság), ao fim do socialismo e subsequente inauguração de um regime multipartidário, vulgo democrático.
Károly casou e teve duas filhas, conheceu os quatro netos e já em viúvo os três bisnetos.
Árpad Zsolt chegou portanto a privar com o bisavô e não por mero acaso.
No início de 2006 foi uma honra conhecer pessoalmente Károly Kadet. Mesmo sem verbalizar o mesmo idioma, a admiração surgiu no imediato primeiro momento e foi uma constante até ao dia de hoje.
A convivência regular, por via de laços familiares entretanto criados, levou a naturais influências; Se por um lado Károly visitou Portugal nesse mesmo ano a convite e propósito de amizade, por outro foi anda oportuna a partilha de algo da sua experiência e sabedoria com quem se mostrou interessado sempre. Com essa demonstração veio uma definição esclarecida e muito personalizada sobre a tangibilidade de certos activos, principalmente no tocante a metais nobres, a distinção entre coleccionismo e o aforro garantido.
Conforme já havia experimentado anteriormente, com sublime inteligência, Karóly adiantou-se ao presente, resolvendo no fim o que sabia ser importante deixando para trás o acessório, antes que fosse demasiado tarde. A idade tem mistérios que somente desvenda quem ela atinge.
O Senhor Károly Kadet partiu sereno e sem sofrimento, por iniciativa própria, no dia 13 de Março de 2010.